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segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

A / D





























Crescer com bonecas para ser uma boneca apaixonada * 

Quando aquele corpo desejado nasceu, depois de mexido e remexido, todos os olhares se centraram no seu sexo e tod@s afirmaram: é menino!

O menino cresceu desejando sempre ser homem e muito mais. O seu corpo dilatou-se enquanto território do eu e d@s outr@s. Do eu que se agigantou à procura do seu género, dos seus interesses, da sua sobrevivência, dos seus afetos, com @s outr@s permanentemente a observá-lo com um olhar apreciador/julgador.

Aquele corpo, aquele eu, viveu sempre de forma distinta entre o espaço público e o privado. Desde menino que gostava de brincar com bonecas. As bonecas cresceram com ele/ela e ele/ela desejava/deseja ser a própria boneca. O corpo é agora apenas um espaço, um invólcuro performativo dentro do qual existe um homem que apenas se liberta quando se transforma, com dor e prazer, numa personagem feminina: a boneca Alexia. David/Alexia cresceu como @s outr@s: brincou, estudou e hoje trabalha e ama, como todos e todas. Hoje, como tod@s @s outr@s, são diferentes.

Alexia está apaixonada por outra mulher. Ou seja, aquele corpo de homem transformou-se numa aparência de mulher para viver uma paixão lésbica.

David/Alexia mostra-nos assim quão diverso é o modo como podemos habitar/viver no nosso corpo, lugar de construção, onde somos e onde nos mostramos. Alexia, como tod@s, vive permanentemente sob o escrutínio de qualquer um (a). Por isso o seu corpo, o seu sexo, o seu género, estão muitas vezes espartilhados e aprisionados. David vive escondido no mundo privado, do lado de dentro da janela, enquanto Alexia deseja voar, fazer a travessia, fantasiar, viver um amor reprimido, que seria naturalmente aceite enquanto David. 

Alexia transforma-se, com dor, para sair à rua bela, mas escondida e provocadora. Sabe que a verdadeira prisão é o medo e que para ser livre, tem que arriscar. Gosta de si, de cada detalhe de si, das suas loucuras, das cores todas misturadas (azuis com rosas, verdes com vermelhos). Sabe que para ser plena tem de ser uma boneca livre, uma boneca que também vive, trabalha, ama e seduz no espaço de tod@s @s outr@s: A rua! 

David e Alexia recusam uma vida cinzenta, como a de muitos olhares a preto e branco que, incomodados, nel@s reparam. 

* Projeto de fotografia documental ficcionado.